Caravana Mekukradjá: Literatura que se faz com ritos e palavras.


Daniel Munduruku
(Diretor Presidente do Instituto Uk’a e Coordenador da Caravana Mekukradjá)


É comum as pessoas aliarem literatura apenas com a palavra grafada em livros. A própria palavra literatura remete a essa idéia alimentada pelo ocidente que costuma separar as diversas manifestações humanas. Para a mente ocidental as coisas estão desligadas entre si. Desconectadas, se quisermos usar um termo do universo cibernético.

Isso faz com que surjam as especialidades e apareçam pessoas que se destacam nisso ou naquilo. Nasce assim, uma sociedade que precisa dos talentos individuais para se sentir realizada e plena. 
Olívio Jekupé
                                    
Mas isso não precisa ser o tempo todo compreendido dessa maneira. É possível pensar de maneira diferente. É possível sair do modo linear do pensar ocidental e entrar numa compreensão mais circular, tradicional, ancestral. Esse pensar nos remete a idéia de que as coisas estão integradas entre si e que elas – as coisas – trazem um saber que lhe é peculiar e que se manifesta a quem está atento aos sinais do universo. Isso tem sido mantido pelos povos indígenas ao longo dos milhares de anos que habitam este planeta. É uma prática que faz parte de uma compreensão de que tudo se manifesta através do corpo: a palavra, o canto, a dança, o rito, a cura, o ser.


Naine Terena
É em função dessa compreensão que temos dado ao fenômeno da Literatura Indígena um status maior do que apenas a escrita. Para os indígenas, a escrita é apenas uma forma simbólica de representação. A dança é outra. O rito é outro. Portanto, compreender a Literatura Indígena é entender, também, que ela não pode estar presa a um conceito apenas. Ela é mais ampla. Mais dinâmica. Mais completa. Compreender a literatura indígena e entender que ela se manifesta nas diversas formas de transmissão do saber; que ela é a reverberação do que mora dentro do corpo de nossa gente. A literatura – entendida nesses moldes - nos completa enquanto pessoas porque nos lembra sempre de onde viemos, para onde vamos e qual o sentido de nossa pertença a esse planeta. É, portanto, um modo todo peculiar de ler o mundo em que vivemos e dar uma criativa resposta às questões que a vida está sempre nos levantando. É assim que entendemos essa forma peculiar de ler o mundo que o ocidente decidiu batizar de literatura. É assim que a temos reelaborado compreendendo que é, também, uma forma de atualizarmos a memória responsável pela manutenção da nossa própria história.
Cristino Wapichana



Instituto Uk`a

A Literatura Indígena é como nossos artistas estão utilizando a escrita para atualizar a memória. Ela é feita de reflexões em versos, prosas, narrativas, mitos. É o coração de parte da gente indígena de nosso país. É a palavra escrita de homens e mulheres que buscam entender este mundo em que vivem e colocam suas impressões na forma escrita. Muitas outras coisas ainda irão se tornar Literatura, mas ainda não foram escritas. Elas ainda moram dentro da gente, dentro da nossa gente. 


Em breve muitas outras palavras serão ditas na forma escrita porque intentamos uma aproximação verdadeira com a sociedade brasileira.

Nós do Instituto Uk’a – Casa dos Saberes Ancestrais – desejamos que estas letras sejam o reflexo do pensar indígena e do seu modo de ser e estar no mundo.



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